Monday, March 27, 2006

Sociedade do Conhecimento

Nesta minha nova situação de assessor, em que tenho que diariamente ser confrontado com situações absolutamente inesperadas, tem valido muito a minha intuição para ser capaz de resolver com sucesso os mais enervantes percalços. A semana passada foi um exemplo de como a criatividade quando bem aplicada dá origem a soluções muito funcionais. Para ir directo ao assunto tenho que vos dizer que a Mónica Love-Wisky é uma fraude.

Ela vinha cá para escolher uma estagiária e só arranjou problemas. Tínhamos umas mil gajas a querer o emprego. Até porque a coisa não está boa e a malta pensa que o estágio não é para trabalhar. Primeiro ela disse que já que eram tantos candidatos entrevistava só os rapazes. Eu lá lhe expliquei que o lugar era para estagiária e que por isso só havia raparigas na bicha. Ela riu-se com o que eu disse e até verteu coca-cola em cima do vestido.

A sorte é que o vestido já estava cheio de nódoas e mais uma menos uma ninguém nota. Então disse que podia mandar embora as que não fossem loiras porque uma estagiária que se prese é sempre loira. Foi um problema porque havia loiras que eram loiras e havia loiras que não eram loiras e eu não sabia como é que as ia distinguir. Quando mandei desandar com o megafone as não loiras, só saíram meia dúzia. Então disse que só seriam aceites sobrancelhas loiras. Foi uma grande confusão. Nunca me tinha visto num aperto daqueles. A minha sorte foi ter-me refugiado na marquise oval que eu, há cautela, já tinha mandado fazer em alumínio blindado.

Mas o facto é que a minha ideia deu resultado. Ficaram muito menos loiras para entrevistar. Bom, eu não quero maçar-vos com as várias peripécias da semana. Foi arrasante escolher uma estagiária à altura. A Love-Wisky tinha um método muito estranho de apalpar a qualidade das candidatas. E na sexta feira às três da tarde já as candidatas tinham sido todas rejeitadas. O Professor passou-se. Fechou-se com a Mónica lá no gabinete que não é oval e passado meia hora chamou-me para que eu arranjasse rapidamente uma estagiária que o contrato com a Love-Wisky tinha expirado e era necessário evitar um incidente diplomático.

Confesso que o meu primeiro impulso foi chamar a Umbelina mas depois lembrei-me que a estagiária era para todos os assessores e achei que não era uma boa ideia. Foi aí que me lembrei da minha amiga Cátia que tinha conhecido na bicha para comprar bilhetes para o Benfica-Barcelona. Então telefonei-lhe e perguntei-lhe a cor dos cabelos. Ela garantiu que era mesmo toda loira. Então dei-lhe a noticia de que passava a ser estagiária em Belém. Ela ficou muito contente e disse que ia já despedir-se da merda do hipermercado onde era caixa e lá estaria na segunda-feira, hoje, para começar a trabalhar.

Como podem reparar é uma história comovente. E vou aproveitá-la para a meditação de hoje. Quando os governos não aproveitam as grandes qualidades das pessoas que têm nos seus países arriscam-se a ficar para trás. Ora é isso que está a acontecer connosco. O país perde todos os dias terreno para países que têm muito menos potencialidade que o nosso. E a culpa é dos governos. Eu agora que estou melhor colocado e lido diariamente, tu cá, tu lá, com as mais bem preparadas cabeças deste país e do estrangeiro, vou-me apercebendo do que é que é importante e do que é que não é. E mais do que isso vou-me apercebendo de como o meu pensamento sempre esteve na vanguarda do pensamento internacional e eu nem sabia.

Desde que tomei posse que todos os dias numa ou noutra reunião se reconhece que aquilo que faz avançar os países é a sociedade do conhecimento. Em todo o lado é a mesma coisa. Os governos movem-se no sentido de implantar uma sociedade do conhecimento. E com isto até se me vêm as lágrimas aos olhos. Que desperdício. O 'know how' que nós acumulámos durante quase mil anos não está a ser aproveitado. Quem melhor que nós portugueses será capaz de usar o conhecimento?

Em minha casa, desde pequenino sempre me apercebi que o conhecimento é que permitia ascender na sociedade. Fui criado num ambiente em que o conhecimento era sempre tido como muito importante e quanto mais importante fosse a pessoa que conhecêssemos melhor. Hora este maná social nunca foi explorado por nenhum governo. Lá fora, no estrangeiro não se fala noutra coisa. Sociedade do conhecimento para aqui, sociedade do conhecimento para ali e é vê-los trepar lugares. E nós até parece que não conhecemos ninguém. Foi nesta filosofia que me lembrei da Cátia. Conhecia na bicha do Benfica e estou empenhado em dar a minha modesta contribuição para tornar este país uma verdadeira Sociedade do Conhecimento.

Joaquim (assessor)

Tuesday, March 21, 2006

Angola é massa

Inúmeras pessoas têm-se-me dirigido preocupadas com a minha ausência no blogue. Estavam já a dizer que como não tive direito a assessora estava sobrecarregado de trabalho e nem conseguia ter um tempinho para os meus amáveis meditadores. Ora bem, acontece que, após a posse todos sabíamos que ia seguir-se um tempito relativamente calmo. É previsível que durante os próximos cinco anos não haja assim nada de muito importante para fazer. Por isso o Professor ofereceu-me duas embalagens de batatas fritas que davam direito a um sorteio de uma viagem a Angola para duas pessoas e um animal de estimação. E tive tanta sorte que me saiu. Vai daí eu, a Umbelina e a Nandinha fomos apanhar um bocado de verão porque já estávamos fartos de inverno. E aqui está a razão de nenhum de nós ter tido oportunidade de postar. O Professor também não postou porque ainda lhe dói a mão de apertar tantos bacalhaus e não é bi-dextro como eu. Agora vocês perguntam: então e porque é que não postámos onde estávamos? É porque estávamos na praia, lá não havia 'net' e, vou ser sincero, nem me lembrei disso. Estávamos na maior e com gente muito simpática que, não sei como, descobriu que eu era assessor do Professor e tivemos tratamento VIP. E tenho que reconhecer que a televisão aqui é muito enganadora. Eu estive lá e vi como toda a gente vive muito bem. Há imensa gente na praia mesmo aos dias de semana e cólera, não vi cólera nenhuma. As pessoas falavam todas muito bem umas com as outras e nenhuma me pareceu encolerizada. É evidente que só passam aquilo que querem na televisão e não tem que ter nada a ver com a realidade. Eu que nem pensava nisso agora tenho que apoiar o governo em seguir a máxima que o Professor já prescreveu do "Para Angola e em força!" Até porque é um país muito rico e com grandes potencialidades. Temos que ajudá-los a livrarem-se de tantas riquezas naturais antes que provoquem outra guerra. Como meditação para hoje quero deixar-vos uma reflexão que tive lá na praia quando estava muito sol que, como sabem quando nasce é para todos. A existência de mais necessitados é comum a quase todos os países. Também em Angola encontrei pessoas muito necessitadas. Umas mais, outras menos mas sempre de mesmo muitas necessidades. Já desfavorecidos não encontrei assim muitos. E mesmo os que encontrei não posso garantir que não fossem apenas dos menos mais necessitados. Um país rico preocupa-se com os seus cidadãos e tenta satisfazer os mais necessitados. Suponho que se outras noções civilizacionais os nossos antepassados não deixaram em África, ficou pelo menos esta poderosa ferramenta do desenvolvimento.

Joaquim (assessor)

Monday, March 13, 2006

Susceptibilidades

Depois de uma semana verdadeiramente extraordinária, aqui estou eu para vos dar de novo o apoio que tanto necessitais. Compreendo perfeitamente a angústia que têm sentido com a minha ausência mas também tenho sentido o vosso apoio das mais diversas formas e com isso pressinto que estáis muito contentes com a minha nova situação. Claro que não vou descrever pormenores da tomada de posse. Muitos escreveram-me a felicitar-me pela minha postura durante a cerimónia. Modéstia à parte acho que estive muito bem. Entre os assessores era de facto aquele que emitia mais charme. E mesmo os estilistas mais exigentes não tiveram nada a apontar-me.
Daquilo que pude assistir mais de perto posso dizer que o Arbusto pai é uma excelente pessoa. Contei-lhe uma série de anedotas sobre o filho e ele fartou-se de rir. Disse-me que ele sempre foi assim inteligente e danado para a brincadeira. Até foi por isso que ele se afeiçoou ao Professor, porque são muito parecidos. Mas não vou entrar em detalhes porque agora tenho que separar as questões de Estado das questões mais pessoais.
Uma coisa muito pessoal que me deixou muito agradado foi ter sido escolhido para tomar o retro-viral Tamiflu. A minha importância foi reconhecida e puseram-me na lista dos que é importante que não apanhem a gripe da aves para que este povo brilhante não se acabe por aqui. Como recebi um convite quadruplo, vou dar um à Umbelina e os outros dois ainda vou ver quem dos meus amigos os merece.
Outra coisa que me deixou excitado foi saber que a Mónica Love-Wisky foi escolhida para fazer a selecção e formação das candidatas a estagiárias cá em Belém. Ela não esteve na tomada de posse por causa de não ferir susceptibilidades mas deve chegar esta semana para começar a selecção. O número de inscrições já é quase tão grande como para o Morangos com Açúcar. E para facilitar vamos fazer excursões ao cabo da Roca para que as que forem rejeitadas não tenham que andar à procura de táxi.
Hoje queria deixar-vos como meditação uma questão futebolística. Como sabem o Benfica é uma referência europeia. Tomem atenção porque isto é silogística pura. Se o Naval empata em casa do Benfica e se o Benfica ainda há dias ganhou ao campeão europeu, então o Naval é melhor que o campeão europeu. Daqui se tira ainda um corolário. O futebol da península é melhor que o da Inglaterra. E como (infelizmente) o Benfica nem está em primeiro o nosso futebol é ainda melhor que os melhores. Como consequência eu diria que o Naval é, neste momento, a melhor equipa da Europa. Vocês pensam: então e depois. Pois a minha proposta é que passemos a considerar o futebol como um interesse estratégico. Assim como outros países têm petróleo e diamantes, nós temos futebolistas. Mas enquanto, mais tarde ou mais cedo o petróleo e os diamantes hão-de acabar, nós vamos ter sempre muitos futebolistas para dar e vender. Já vejo um Portugal enorme do Minho a Timor com uma diáspora futebolística em que parte significativa das selecções nacionais dos vários países, são portugueses naturalizados. Vou propor na próxima reunião do Conselho de Estado um estudo genético da população para ver em que parte do genoma está a bola de futebol. Se conseguir-mos este projecto vamos continuar a ter imensas remessas de emigrantes e continuar a viver há grande sem ter que fazer a ponta dum corno.


Joaquim (assessor)

Friday, March 03, 2006

Coabitação

Nesta minha última intervenção antes da tomada de posse quero aqui deixar o meu apreço ao meu assessor Jakim pelo excelente trabalho desenvolvido nesta fase dura de preparação de cinco anos de grande mudança neste país. A sua colaboração tem sido de uma dedicação inexcedível e não fosse tratar-se de uma pessoa modesta e jovem, teria já todas as condições para transitar para um excelente cargo de direcção de um empresa pública, o que lhe permitiria ter uma reforma dourada aos trinta e cinco anos. Mas a sua devoção ao país é tal que vai permanecer como meu assessor para o sector da cultura que é, como sabem, o mais difícil.
Os portugueses não estão habituados às questões culturais e principalmente desde que, graças à minha eficaz governação, passaram a medir o grau de desenvolvimento pelo número de electrodomésticos, a cultura regressou ao lugar de onde nunca deveria ter saído, isto é, à mão de quem a entende e patrocina. A acção do Jakim vai, assim, inscrever-se numa tónica de acentuada elitização para que passemos a ter uma cultura que possa ombrear com a cultura dos outros países europeus e sairmos, como é meu lema, da cauda da Europa.
Neste programa, que em nenhum ponto vai colidir com a política do governo legitimamente eleito, vamos mais uma vez empenhar-nos em grandes empreendimentos culturais como a casa da música da Ota, o centro cultural de Fonte de Boliqueime, um estádio de futebol coberto em cada um dos concelhos do país, ligação ADSL para todas as novas habitações - substituindo as canalizações de água que em breve serão inúteis, um túnel cultural a atravessar Monsanto e outro a ligar Gaia ao Porto por baixo do rio Douro e muitas outras iniciativas que muito vão facilitar a coabitação com o Engenheiro.
Dada a extensão do meu grupo de trabalho, e porque permaneço uma pessoa simples e poupada, só alguns dos meus assessores vão ter direito a assessores próprios. O clima de contensão a que o governo está a sujeitar os portugueses, e muito bem, diga-se de passagem, deve ser acompanhado por mim e por aqueles que me são próximos, da postura adequada que a situação exige. Nesse sentido já dei ordens para que ninguém apareça à imprensa sem estar devidamente ataviado, com porte adequado e sempre com a maior seriedade no rosto. Usar da maior discrição, falar o mínimo ao telefone e sempre que necessário recorrer a marquises opacas.
O Jakim, dada a sua capacidade de trabalho, não terá direito a uma assessora como pretendia, mas poderá recorrer à estagiária que vai estar disponível para todos os assessores.
A bem da nação.

O Professor